Coronavírus: Câmara aprova PEC que cria ‘orçamento de guerra’

Proposta cria orçamento separado para destinar recursos exclusivamente ao combate ao coronavírus. Texto segue para o Senado.

Câmara dos Deputados aprovou nesta sexta-feira (3) a proposta de emenda à Constituição que cria um orçamento paralelo, chamado de “orçamento de guerra”, para destinar recursos exclusivos às medidas de combate ao coronavírus.

Somente o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e alguns deputados compareceram ao plenário. Para evitar uma aglomeração de deputados no plenário, o que aumentaria o risco de contágio pelo coronavírus, a maior parte dos parlamentares participou por meio de videoconferência e registrou o voto em um aplicativo eletrônico.

No primeiro turno, a PEC foi aprovada por 505 votos a 2. No segundo, por 423 votos a 1.

Durante a sessão, o PSOL apresentou um destaque (sugestão de alteração da proposta) para retirar a possibilidade de o Banco Central comprar e vender títulos de crédito privado público e privado sem intermédio de terceiros, mas a alteração foi rejeitada por 388 deputados (veja os detalhes mais abaixo).

Quando chegar ao Senado, o texto também precisará ser votado e aprovado em dois turnos. A PEC não vai à sanção do presidente, é promulgada pelo próprio Congresso.

Na mesma sessão, os deputados aprovaram um pedido de urgência para acelerar a votação do chamado Plano Mansueto, proposta de ajuda fiscal aos estados e municípios em dificuldade financeira. O texto deve ser analisada na próxima segunda (6), segundo previsão da Câmara.

 

Amarras fiscais

 

O objetivo da PEC aprovada nesta sexta é separar do Orçamento-Geral da União os gastos emergenciais que serão feitos para enfrentar a disseminação do coronavírus e, assim, não gerar impacto de aumento de despesa em um momento de desaceleração da economia do país.

O “orçamento de guerra” vai vigorar durante o estado de calamidade pública, que já foi aprovado pelo Congresso e tem validade prevista até o dia 31 de dezembro deste ano.

O texto permite que o governo gaste os recursos sem as amarras aplicadas ao orçamento regular, como a regra de ouro – que está na Constituição e proíbe o governo de contrair dívidas para pagar despesas correntes, como salários.

Essa regra, assim como as restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal, não será aplicada ao orçamento de guerra. Sem esses gatilhos de austeridade, o governo consegue prever gastos maiores e mais rápidos para responder às demandas do sistema de saúde.

O Palácio do Planalto chegou a alegar que dependia da aprovação da PEC para fazer o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 aos trabalhadores informais. O argumento do governo era de que, sem garantia constitucional, abriria margem para questionamentos judiciais.

A avaliação mudou, e o auxílio foi publicado no “Diário Oficial da União” desta quinta (2), junto com uma medida provisória abrindo crédito para os R$ 98 bilhões necessários para os três meses de auxílio.

 

Conselho

 

A PEC aprovada também prevê a criação de um um “Comitê de Gestão da Crise”, que terá a responsabilidade de contratar pessoal, obras, compras e ações.

O colegiado será presidido pelo presidente da República e integrado por:

 

  • ministros da Secretaria-Geral da Presidência da República, da Saúde, da Economia, da Cidadania, da Infraestrutura, da Agricultura e Abastecimento, da Justiça e Segurança Pública da Controladoria-Geral da União e da Casa Civil;
  • dois secretários estaduais de Saúde, dois de Fazenda e dois da Assistência Social, escolhidos por conselhos nacionais e sem direito a voto;
  • dois secretários municipais de Saúde, dois de Fazenda e dois da Assistência social, escolhidos por representantes de entidades dos setor e sem direito a voto.

 

Ao longo das discussões entre os partidos para construir a proposta, a composição do colegiado foi um dos pontos mais alterados. Em uma das primeiras minutas, o colegiado seria presidido pelo ministro da Saúde e não teria a participação do presidente da República.

Na versão final, ficaram de fora o ministro da Secretaria de Governo e representantes da Câmara, do Senado, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Além disso, o relator permitiu que o presidente altere os ministérios que compõem o conselho – sem poder, no entanto, aumentar ou diminuir a quantidade de membros.

 

Poder

 

A PEC dá ainda ao Congresso Nacional o poder de suspender qualquer decisão do Comitê de Gestão da Crise ou do Banco Central “em caso de irregularidade ou de extrapolação aos limites”.

O governo queria a retirada desse ponto, mas o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deixou claro que os deputados faziam questão desse trecho.

Segundo parlamentares ouvidos pelo G1, o objetivo é suspender medidas que possam ser tomadas na contramão das recomendações de autoridades sanitárias, como a Organização Mundial de Saúde (OMS).

 

Veja mais pontos da proposta:

  • Medidas provisórias

A PEC diz que o Congresso Nacional terá 15 dias úteis para se manifestar sobre as medidas provisórias editadas pelo governo para liberar créditos extraordinários.

  • Banco Central

A PEC autoriza o Banco Central a comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, nos mercados secundários local e internacional, e direito creditório e títulos privados de crédito em mercados secundários.

O montante de cada operação deverá ser autorizado pelo Ministério da Economia e informado ao Congresso, sendo que será exigido aporte de capital de pelo menos 25% pelo Tesouro Nacional. Além disso, o presidente do BC terá de prestar contas ao Parlamento a cada 45 dias das operaçõe

Segundo o presidente da Câmara, a permissão para que o BC compre títulos diretamente, sem passar pelo sistema bancária, irá garantir capital de giro às empresas. Críticos a esse ponto argumentam, porém, que a PEC abre brecha para a compra de “créditos podres”, que são dívidas que já estão há bastante tempo vencidas e, portanto, de difícil recuperação.

  • Ações no STJ

Ressalvada a competência originária do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal Superior Eleitoral e do Superior Tribunal Militar, todas as ações judiciais contra decisões do Comitê de Gestão da Crise serão da competência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

  • Fiscalização

Os atos da gestão do Comitê de Gestão da Crise serão fiscalizados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

  • Transparência

As atas, decisões e documentos examinados e produzidos pelo comitê devem ser divulgados nos portais de transparência do Poder Executivo e do Poder Legislativo e no do Tribunal de Contas da União. O sigilo dessas informações está proibido “sob qualquer argumento”.

Por Fernanda Calgaro e Elisa Clavery, G1 e TV Globo — Brasília

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